domingo, 22 de maio de 2016

cantarei assim como se a música não existisse e fosse preciso inventá-la, abraçado às sombras e solar sobrevivendo uma vez mais nos guetos numa pulsação ingovernável de deleites, tenho pensado que os caminhos levam sempre a becos sem saída e que talvez a única saída seja não haver caminhos, cantarei a minha devoção gratuita e sem fim por alegrias vulcânicas tingidas de neon nos bares ou submersas numa névoa de histeria nos salões mais sérios ou serenas de velhice ou infantis correndo com os pés descalços pelo asfalto sujo, não espalho as minhas frases com tanto cuidado só pra parecer que elas choveram mas porque eu gosto mesmo  é de colorir a razão ignorando os seus contornos, adoro que o meu tempo seja uma sequência apaixonada de ilusões e jaulas desmentidas por um corpo que é sua própria alma e emoção e pensamento em trânsito e adoro quando me demoro indiferente e sonolento numa só verdade confortável, tanto faz se estou sendo arrastado uma vez mais à margem do que é sóbrio e sigo bem no centro do que não tem órbita, tanto faz se o que nos revela é o que nos disfarça ou vice-versa, cantarei não porque a vida é um erro ou porque deus queira ou não queira – eu sou também a voz que silencia, e sou todas as vozes que jamais se calam – cantarei meus hinos e meus gritos de revolta e minhas lágrimas e risos e meu nada e minha ausência e meu vazio e meus lábios, cantarei porque já cantava muito antes que surgissem as palavras, inteiro e a plenos pulmões embriagado de uma lucidez que sobra e panfletário e me abstendo cantarei todas as nuvens e castelos que me cabem, porque não sei por que, nem saberei quando terei cantado.

2 comentários:

Beti disse...

Porque temos que cantar, a vida assim fica mais leve e colorida

Anônimo disse...

Porque se não cantarmos vai morrer do mesmo jeito, então hemos de cantá-la la la ra la ra la ra.