sexta-feira, 25 de novembro de 2016


Comprei cinco dados feitos de sal.

Quando chegávamos à Isla del Pescado, Patrícia comentou: “A natureza é criativa, né? Se uma criança dissesse: ‘Eu vou desenhar um mar branco feito de sal, e no meio uma ilha coberta de cactos’, você diria: ‘Hm... crianças’”.

Escrevo pra ocupar as mãos; na boca, em vez de um cigarro, um chiclé de menta. O grupo está passeando por aí e eu não quis pagar os quinze bolivianos de entrada pra ilha.

Mais de dez mil quilômetros quadrados de puro sal e eu só consigo pensar em um texto do vizionário: “A gente vai ter que ter tequila pra caralho!”

Antes, no caminho, teve uma hora em que fechei os olhos incomodado pelo


fechei os olhos incomodado pelo excesso de luz e tive um momento místico que não sei explicar nem me interessa fazê-lo. Só tenho a dizer que tudo no mundo está em seu devido lugar.

Sim, porque seria redundante dizer que estou completamente em branco.
Salar de Uyuni - Bolívia

sexta-feira, 18 de novembro de 2016



tenho pensado em você todos os dias, em teus lábios e teus dentes, naquela blusa amarela com um fio puxado na manga, a forma como você esmurra o botão do elevador com a lateral da mão, teus lábios e teus dentes, no tempo que leva pra você contar a história enquanto a gente dá uma volta na lagoa, no tempo que leva pra esfriar o brigadeiro e nos teus dentes, tenho pensado o dia inteiro nos teus dentes, em tapetes voadores e em arcanos de tarô de quando você fecha os olhos, na tua voz quando é um gemido, o brilho nos teus lábios da nossa saliva, todos os dias, tenho pensado o dia inteiro nos teus lábios e teus dentes.

sábado, 12 de novembro de 2016


I wish I was anarchist.

onde eu não vou ficar amigos me perdoem / o horizonte que falta me inquieta / mentiras repetidas ainda são mentiras / mocinhos e vilões / giram na mesma órbita

a vida passa à margem de papéis amarelados / teorias e leis não tocam essa efervescência / e eu conheço pelo menos sete / milhões de erros mais interessantes / do que pensar que estou certo

mas virão desesperados engolidos pelas trevas / arranhar as portas / sempre abertas / seus espelhos ainda mostram sábios / suas mãos estão cobertas de sangue

não amigos não me esperem / o planeta / cobrará seus espólios / ninguém / assistirá ao espetáculo

onde eu não vou ficar onde já sei que não basto / a minha ingenuidade terá me salvado / de estreitas celas / enfeitadas / cinzas deste circo dos palácios

sexta-feira, 4 de novembro de 2016


Olha agora aquela vida frágil emergindo dos escombros
Pálidas mãos tateando à procura
Ela vai encher de novo os seus pulmões com ar e luz do sol
Está no limite da morte e se move sem motivos
Olha agora está sangrando um lírio um arco-íris
Por que você prefere ecoar a arrogância?
Por que espera que alguém jogue só mais uma pedra e acabe com tudo?
Olha agora a sua nudez vai rastejando suor de lama e de tremor
Olha agora ela não tem um nome e está chorando um diamante azul
Do que você se esconde em seu escárnio?
O mundo já transborda os egos
Deixe
Se nas tuas mãos de raiva não couberem seus quasares
Deixe que ela se vá
Agora ela já está desfigurada e olha agora
Seus ossos viraram pó
Olha
Agora ela te acena um barco a velas