Tive que descer pro inferno e só te levei comigo até o
vigésimo oitavo degrau. Não sei se te subestimei ou se exigi demais, só que no
inferno a gente não poderia mesmo ter entrado de mãos dadas. Se fosse indo pro
céu seria a mesma coisa, porque o teu céu tem todo aquele algodão-doce rosa e
chafarizes de cristal e pérolas no enfeite de cabelo enquanto o meu tem uns
lagartos coloridos, fruteiras públicas e grandes varandas sobre abismos e
oceanos índigo. Se eu dissesse que você não é o que pensa, você entenderia que
não é teus pensamentos ou pensaria que eu estivesse te acusando de ter uma
opinião errada a teu próprio respeito? Se bastasse acreditar que os pensamentos
correm pra onde querem, alcançar toda a profundidade dos contrários e de não
haver contrários ou digamos assim se o coração reinasse a rédeas soltas então
caberia entender alguma coisa, ou serviria de algo? Nenhum instinto há de ser
encorajado porque todos sujos e perversos e a razão somente a civilização nos
fez desenvolver algum cuidado algum olhar ao próximo? Já é lei que a bondade a
consciência são o discurso de consolação dos perdedores e nada, nada, nada nada
mais? Sobrou somente a estrada de terra batida e quem sabe os pés, só um agora
previsível e suspiros e talvez flores de cactos, essa falta de imaginação que
me fulmina, a indisponibilidade, a minha preguiça de falar recorte-aqui se
estou traçando a linha pontilhada? Mas ah, um poço de luz se acende imenso
sempre que mergulho em busca da tua imagem – e pelo menos isso ainda posso dizer
que é verdade. Que é o teu bem o que eu quero, que eu ganhei estou crescendo e
que você me faz acreditar em dias melhores – eu sei, posso até ver é cada vez
mais claro. E por tudo o que há de mais sagrado neste mundo: se todo o resto
for a pena, vale.
Um comentário:
as vezes temos que ir ao fundo do poço pra depois voltar, é sempre assim
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