sábado, 8 de abril de 2017

Fez quarenta graus à tarde.

Trocamos a cerveja por água de coco.

Fui visitar Eva em Santos me perguntando se aquele seria o nosso último encontro. Muitas vezes, em nossas viagens, andando ao seu lado pelas ruas de uma cidade qualquer ouvi ela dizer que nada ia durar até depois de virarmos a próxima esquina. Eu costumava brincar dizendo que sim, claro, a qualquer momento uma erupção solar pode transformar o planeta em um caldo fumegante de civilização avançada – mas daquela vez eu não estava achando graça. Nem apoiava a sua decisão de não ter um perfil no Facebook e outras restrições à tecnologia que dificultavam bastante uma comunicação à distância. Sobre o Fecebook, ela explicava:

– Eu ficaria muito tentada a falar com todo mundo ao mesmo tempo... E ficaria louca vendo cada um falar de uma coisa diferente ou alimentar o ódio dos dois lados de uma coisa só.

Caminhávamos sem pressa do Canal 2 ao 4, parando aqui e ali pra que eu fotografasse alguma coisa, e falávamos sobre ilusões de avanço, de como pensávamos que a esta altura de nossas vidas já teríamos conquistado o mundo, do que é envelhecer, da diferença óbvia pra nós dois entre maturidade e cinismo.

– Nada pode ser mais triste – considerei – do que a impressão de que a gente já esgotou todos os discursos capazes de despertar bons sentimentos. De que toda e qualquer palavra que a gente disser pode e vai ser explicada à luz de uma teoria qualquer que reduza o ser humano a puro egoísmo.

– É claustrofóbico – definiu ela.

Pensávamos que a esta altura de nossas vidas já nos sentiríamos livres.

– “Liberdade” não é uma palavra muito adolescente? – provoquei.

– Só sei que quando eu tinha dezesseis – ela falou – achava que a função dos adultos era eles se acharem melhores e mais importantes que os adolescentes. – Fez uma pausa, como se refletisse. – Agora que eu sou adulta, tenho certeza!

Rimos.

– Quando eu tinha dezesseis, – eu disse – às vezes parecia que tinha oito. Ou oitenta.

– Mesmo agora, que estou com cinquenta e cinco, às vezes ainda parece que eu tenho oito ou oitenta – emendou ela, que ainda estava longe de ter cinquenta e cinco.

Rimos outra vez, depois seu olhar se perdeu em direção ao mar.

– Tem dias que eu nem nasci – filosofou. Aí olhou pra mim com um sorriso meio triste e meio malicioso, arqueando as sobrancelhas: – E tem dias que eu não morro nunca.

Um comentário:

Unknown disse...

Fiz uma viagem ao ler ...