terça-feira, 20 de novembro de 2018
Eu me feri porque
fui humano, ainda cometo muitos erros, nem sempre há esperanças, nem sempre
nada me contém. Mas me deixe esquecer disso tudo hoje à tarde, eu sei do que e
do quanto eu posso ser, aceito o que não tenho, não te peço amor, não te peço
que me faça deus, nada vai mudar o fato de que eu sangro. Perdi porque estive
sempre à procura, morri todas as vezes que as minhas forças me deixaram, de vez
em quando, só, foi que depois de morrer encontrei outras. Não penso que estar
vivo é um fardo, ofereço o melhor que posso, às vezes até mesmo tudo que
possuo. Agora me deixe quieto, não tente, as águas estão sujas pelos que
passaram revirando a terra do fundo, a ventania meio que despetalou o meu
telhado, algumas sementes não vingaram, frutos apodreceram, corações demais
foram despedaçados. Só me deixe em qualquer canto, não importa, a salvação é
essa e eu não preciso de mais nada, mas te agradeço se ficar por perto. Mas te
agradeço se me fizer uma prece, assim como agradeço pelo tom exato de silêncio.
Lá fora é um engano, uma queda, o meu corpo inteiro é um grande desencanto. Não
quero. Não minto. Falhei porque sou homem, estou chorando porque já não sou
criança. É inevitável, eu sei, bem mais do que um direito. Mas, mesmo assim,
qualquer perdão é um descanso.
segunda-feira, 12 de novembro de 2018
queria que o tempo se desfizesse, ela
escreveu.
Era isso. Ela estava
jogando. Ele estava tentando se aproximar dela havia meses, com o maior cuidado
– ela com o coração ferido e fechado por um mau relacionamento recente – e
agora ela estava fazendo o Jogo das Grandes Frases, sobre o qual ele tinha falado
uns dias antes. Estava na rua, mas parou ali mesmo pra responder, parecendo
meio bobo pra quem passava, digitando com um sorriso mal disfarçado:
coragem é
morrer como árvore
E foi naquele exato
momento que começou a chover. Correu os olhos em volta, viu que o abrigo mais
próximo estava longe e que ele tinha que ir depressa. A chuva ia ficando mais
forte e o vento estava arrastando lixo e folhas mortas pelas ruas de Porto Alegre,
era outono, fazia frio. Logo que ele chegou ao abrigo, sentiu o celular
vibrando no bolso. Pegou, rápido, pra olhar e leu:
O amor é sempre o primeiro a ser sacrificado.
Não entendeu o ponto
final e o começo em letra maiúscula, será que ela queria dar um peso maior à
frase, será que acreditava mesmo naquilo? Ele não acreditava. Ou não queria
acreditar, o que, pra todos os efeitos, dava na mesma. Eu tenho um templo comigo, estava digitando, mas depois apagou,
sentiu o vento batendo no rosto, pensou "são quatro horas da tarde e ela
está no horário de trabalho jogando o Jogo das Grandes Frases comigo".
Respirou fundo.
quero morar pra sempre em Porto Alegre,
escreveu. Já tinha apertado o “enviar” quando pensou em outra, que decidiu
mandar mesmo assim, porque achou melhor que a primeira:
às 7 horas vou te dar uma rosa
Estava olhando quando
as duas mensagens foram visualizadas. Acompanhou enquanto ela digitava uma
resposta, esperou, esperou bastante tempo, depois teve que esperar mais um
tempinho. Abaixou o celular e voltou a olhar pra rua inundada pensando em
quantos ônibus teria que pegar, onde encontraria uma rosa no caminho da casa
dela, como faria pra se proteger daquele frio e daquela chuva. O celular vibrou
em sua mão e ele ergueu depressa pra olhar, curioso, mas depois de todas
aquelas horas digitando, ela tinha mandado apenas um:
tá
E ele, claro, abriu o
sorriso mais largo.
terça-feira, 6 de novembro de 2018
Enquanto eu feito de poesia não vejo.
A noite me absorve, alguma coisa não resta.
Mas se essa rua me arrasta, eu erro.
Cigarro amassado no bolso da roupa de festa.
A lua, ela sim. Mas eu um poço de mágoas.
A santidade me cansa. Chegar é muito longe.
Você não me perdoa defeitos que também tem
E que eu nunca disse que eu não teria.
Ou talvez não devêssemos ter bebido tanto.
Amanhã nunca foi quando, estou com sono, este verso é muito comprido e isso me deixa mau humorado.
Esmagado. Mas lembro. Apenas eu e quem estava do meu lado é que sabemos
Quem realmente estava do meu lado.
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