quarta-feira, 18 de março de 2020

Sabe quando você sente as mãos frias de uma tempestade ao redor do seu pescoço
O ar cortando a voz de todo grito de socorro é cheio de pequenas lâminas de gelo
Não dá pra encostar a testa na janela do ônibus e sonhar em uma estrada tão esburacada
E nenhuma luz engana a cegueira de quem viaja rumo ao leste na hora em que amanhece
Eu ando assim despedaçado em sacos de lixo rasgados por todas as ruas de todas as cidades
Não estou muito à vontade com a completa falta de horizontes nas paredes do seu quarto
Nunca fui habituado a ter a imaginação dependendo de internet rápida
Sabe quando você quer aquele gosto preto e fresco de uma noite cravejada de grilos
A transparência água limpa o milagre jorrando de uma só palavra de amizade
E tudo que há ao redor são só milhares de milhares de anos-luz de vácuo
A dor espalhada como um brilho quieto e derramada quente sobre o coração em chamas
Ninguém pode provar por a+b que a culpa é minha por qualquer justiça que me subtraiam
E você não precisa repetir os códigos que já me provocaram tantas cicatrizes
Nem por isso eu tenho a obrigação de concordar que o medo dite as regras daqui pra frente
Nem por isso eu tenho a obrigação de nada ou acho que uma coisa deva necessariamente levar a outra
Sabe quando as lágrimas pesam como inacreditáveis gotas de chumbo sobre suas asas
Sabe quando o sangue chove e mesmo assim há multidões ajoelhadas adorando o céu de sacrifício
Sabe quando as jaulas não vêm com passagens secretas
O perdão pode soar como um remendo em roupas muito gastas e com um design ultrapassado
Mas bem que eu gostaria que chegasse até você um pouquinho só desse eu estar me importando de verdade
E que você pudesse ver o que estou vendo
E que também o que não sou eu pudesse ser visto de dentro pra fora
Pelo menos uma vez só que fosse
Em minha vida toda

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