quarta-feira, 9 de setembro de 2020

Conheceram-se no caixa de um restaurante, depois descobriram que tinham ambos o resto da tarde livre, então por que não, o rapaz conhecia uns lugares interessantes pra visitar ali perto. Mas não conhecia ninguém na cidade: tanto quanto Joaquin, estava lá só de passagem. “Ninguém gosta de mim”, repetiu algumas vezes com os olhos baixos, e Joaquin via algo de sua própria tristeza refletida no rapaz. Naquela época, trabalhava como representante comercial, tentando vender sucos de frutas que não nasciam a menos de mil quilômetros das cidades onde ia. Passava muito tempo na estrada e muito pouco tempo em cada cidade – e também não conhecia ninguém naquela, mal lembrava seu nome. Também tinha a impressão, muitas vezes, de que ninguém gostava dele.

– Vezes até demais – confessou.

E quando contou essa história, demorou-se, nesse ponto, em alguma lembrança silenciosa, os olhos perdidos por um longo instante, sem revelar mais nada.

Ele se chamava Martim, disse, afinal. Estava hospedado em um albergue ali perto e parecia bastante chateado com alguma coisa que tinha acontecido lá, mas não dava pra entender direito, ele falava sem parar e às vezes eram coisas sem nenhum sentido, repetindo o refrão “Ninguém gosta de mim” muitas vezes, vezes até demais. Mostrou o nome do ex-namorado tatuado no braço, teve que abaixar um pouco a calça e a cueca pra mostrar a tatuagem de pequenas e delicadas flores ligadas por um fio. Disse várias vezes que achava o Joaquin lindo, lindo, lindo demais pra estar solteiro, acariciava o seu braço, uma vez ou outra tentou segurar sua mão.

– Mas eu não me importava com isso – disse Joaquin. – Acho que até aquele dia eu não tinha me dado conta do verdadeiro peso da minha solidão.

Martim. Eles andaram juntos a tarde inteira, depois acabaram em alguma lanchonete tomando o suco de uma fruta que só nascia naquela região e de que Joaquin nunca tinha ouvido falar. Foi com o rapaz até o portão do albergue, deixou-o lá, despediu-se, já estava outra vez andando em direção à rua. Martim se sentou em um banco encostado ao muro, debaixo de uma árvore, e parecia mergulhado em sombras quando Joaquin se virou pra trás pelo que pensou que fosse a última vez. O rapaz escrevia em um caderno pra depois procurar por ele no Facebook, em letras garrafais: JOAQUIN. Ninguém gosta de mim, estava dizendo ainda, ninguém gosta de mim, ninguém gosta, ninguém. Por que você está indo embora? O que foi que eu fiz?

– Aí nessa hora eu fui até ele – contou Joaquin, – segurei seu rosto entre as mãos e beijei... não, beijei não... mordi seu lábio inferior.

Fez uma pausa, durante a qual perguntei:

– Mas por que você fez isso, Joaquin?

E ele:

– Ah, sei lá, pô... Acho que... Todas as frutas.

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