sábado, 21 de novembro de 2020

“É logo ali”, alguém falou, horas depois eu estava no alto de alguma montanha sem conseguir enxergar onde a estrada acabava, sem nenhum sinal de habitação humana por perto, apenas uns poucos carros e caminhões que passavam a longos intervalos. Algumas vezes levantei o braço com o polegar estendido, outras, não me dei ao trabalho, distraído que estava com a paisagem, às vezes por estar me lembrando de alguém ter dito “É logo ali”. O sol ardia sem piedade, o mochilão começava a ficar desconfortável de carregar, mas a brisa no rosto, mas ser um homem sozinho naquele silêncio do meio do nada, com aquela paisagem, mesmo que agora a estrada parecesse ser maior do que eu podia alcançar, eu preferia ir a pé. E eu ia.

“Aqui por essas terras”, disse um homem sábio em uma das muitas caronas que peguei, “não dá pra levar ao pé da letra quando alguém diz ‘É logo ali’”. E isso depois de me informar que só poderia me levar até uma parte do caminho, e antes de uma longa viagem que incluiu quatro ou cinco paradas pra colher frutas, ver algum rio ou dar um oi pra um conhecido no caminho. Desembarquei outras tantas horas mais tarde, em lugar nenhum, “Eu vou por esse caminho ali, você desce essa estradinha e [aqui começa uma série interminável de instruções com pontos de referência dos mais absurdos, voltas e voltas por encruzilhadas e porteiras e pequenas pontes feitas com troncos de árvores, sobe ladeira e desce ladeira, depois é logo ali], não tem como errar”.

No início da noite, eu me aproximava do meu destino acomodado nos fundos de um caminhão, um pouco da poeira da estrada ainda chegando até onde eu estava, mas uma visão perfeitamente limpa de um céu carregado de estrelas até quase as finas camadas de amarelo e vermelho sobre a linha do horizonte – e parecia que o sol tinha ido embora havia tanto tempo. Estava logo ali. Eu me sentia alguns amigos mais velho, alguns anos mais perto dos desconhecidos que me esperavam, mantinha os olhos bem abertos, registrando cada detalhe. Nenhum sinal de luz elétrica, nenhuma casa, nada. Respirei profundamente. Tudo, até o cheiro era azul escuro.

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