domingo, 27 de dezembro de 2020

Tinha uma festa na sua rua, mas ela estava lá porque era a sua rua, e não porque era festa, e tinha um ar meio que de ter sido roubada, de não saber mais o caminho de casa, de quem me via pela primeira vez. E foi assim: no instante em que me viu, me abraçou, demorou-se um pouco no abraço.

Não houve um tremor de terra, nem um arrebatamento.

Gesto comum em roupas de rotina. Gesto puro gesto, não mais do que abrir uma torneira e encher um copo com água, dar duas voltas na chave pra trancar a porta. Noite animada esparramada na rua, as crianças correndo as músicas maçãs do amor luzes da praça.

Talvez fosse o abraço mais melancólico da História, mas o momento engolia o que quer que se pudesse dizer a seu respeito.

Nem houve uma suspensão do tempo, ao contrário: era quase como se desemperrasse uma engrenagem.

A vida acontece, e acontece, e acontece.

A imagem, só ela se guardou. Mais uma pedra arremessada com displicência no rio, alterando sutilmente – e pra sempre – o curso de suas águas.

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