sábado, 29 de outubro de 2022

Não se pode dizer que algum dia 
Chegaram ou chegarão a atravessar a vida 
Você pode vê-los à margem, receosos até mesmo 
De molhar os pés, a menos, talvez, 
Que alguém fantasiado de autoridade (especialmente divina) 
Diga tá ok então desta água bebereis 
Mas só um pouco 

Um bando de corvos e palhaços se alvoroça ao seu redor 
Gargalhando de sua credulidade estúpida, enriquecendo 
Às suas custas e ilicitamente a olhos vistos, enquanto 
Disparam as ordens mais disparatadas 
Agora jogareis esta água suja no cantil do vosso irmão 
Agora sobre esta água deitarei um século de sigilo 
Agora esta água é só minha 
Que morram de sede, eu não sou coveiro 

Odeiam sobretudo as almas livres, morrem de medo de ideias, 
E do fato de que a água é simplesmente de todos 
De que há água para todos 
De que é possível mergulhar de cabeça e de que há mundos inconquistáveis nas profundidades 
Por isso desperdiçam a existência construindo jaulas e empunhando armas de fogo 
Ajoelhados diante de qualquer pedaço de lixo 
Para onde os seus verdadeiros ídolos apontem dizendo ali está Deus 

Não 
Não se pode dizer que algum dia 
Chegaram ou chegarão a amar 
Apenas que compraram uma porção de afetos 
E que os arrastaram às masmorras em que soterrados 
Morrem décadas mais tarde discursando enfurecidos contra 
Um suposto mundo lá fora 
Onde rios imaginários 
Vorazmente engoliriam seus tesouros embolorados se 
Alguma vez 
Sequer tivessem ousado se molhar

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